Primeiras composições e parcerias

Em 1964

Toquinho teve a primeira composição sua a receber letra. Essa canção tem uma história, contada por Toquinho: “Eu estava comToquinho e chico buarque uma das moças que faziam a coreografia, dançando no show “Na Onda do Balanço”. Chamava-se Vera, morena, alta, corpo bem feito. Por sua vez, Chico habituara-se a passar quase todas as noites no teatro pelo gostinho de ouvir sua música, e às vezes esticava a noite com a gente. Num dos jantares na casa do diretor, na intimidade de uísques e outras fontes de inspiração, enquanto eu tocava uma música, Chico aproveitava o embalo e, brincando com a moça, inventava versos com rimas em era: Linda noite que te espera, oh, Vera/ Quisera abrir janelas, fazer serão…. No dia seguinte, mais sóbrio, organizou melhor a poesia e se surpreendeu: Mas a letra é boa mesmo! Podemos fazer uma música!

As rimas em era foram mantidas em respeito à inspiradora. A melodia traduz uma profunda dolência romântica, que casada com a poesia, resultou a canção “Lua cheia”, a primeira melodia de Toquinho a receber uma letra, e de Chico Buarque.

“Ninguém vai chegar do mar
Nem vai me levar daqui
Nem vai calar minha viola
Que desconsola, chora notas
Pra ninguém ouvir.

Minha voz ficou na espreita, na espera
Quem dera abrir meu peito cantar feliz
Preparei para você uma lua cheia
E você não veio, e você não quis.

Meu violão ficou tão triste, pudera
Quem dera abrir janelas fazer serão
Mas você me navegou mares tão diversos
E eu fiquei sem versos
E eu fiquei sem em vão”.

“Lua cheia” se constituiria, três anos depois, em 1967, na primeira canção de Toquinho gravada em disco, no LP da RGE, “Chico Buarque de Holanda – volume 2”. Anos mais tarde, Toquinho faria com Chico Buarque mais duas músicas: “Samba de Orly”, com participação de Vinicius de Moraes, e “Samba pra Vinicius”.

No 3° Festival da Canção Popular da TV Record, Toquinho concorreu, de parceria com Vitor Martins, com a música “Belinha”, cantada por Wilson Simonal, desclassificada, porém, na apresentação inicial. “Foi minha primeira música que ouvi tocada no rádio”, comenta Toquinho.

Em São Paulo, quem não conhecia o Jogral do Carlos Paraná em 1968? Quem não freqüentava aquele bar do comecinho da rua Augusta para curtir a roda de boêmios desfilando talentos musicais? Um deles, que habitualmente bebia sua pinguinha por lá, era Paulo Vanzolini, mordendo seu cachimbo e espalhando todo seu verbalismo de poeta e repentista. “Eu já tinha amizade com o Paulo Vanzolini, um letrista com quem sempre quis fazer alguma coisa”, conta Toquinho. “Naquela noite, no Jogral, ele chegou para mim e escreveu em um papelzinho duas estrofes. Fiquei com aquele papel, e demorei para fazer a música. Criar uma melodia para uma letra já pronta é um grande desafio. Cada palavra tem um som dela própria, e tem-se que descobrir esse som. Por isso, foi muito trabalhoso achar uma linha melódica natural para “Boca da noite”.

“Cheguei na boca da noite
e saí de madrugada,
eu não disse que ficava,
nem você perguntou nada.
– Na hora em que eu ia indo
dormia tão descansada.
Respiração tão macia
morena nem parecia
que a fronha estava molhada.
Gente da nossa estampa
não pede juras nem faz,
ama e passa e não demonstra
sua guerra, sua paz.
– Quando o galo me chamou
parti sem olhar pra trás,
porque morena eu sabia,
se olhasse não conseguia
sair dali nunca mais.

Refrão
Vi um rosto na janela,
parei na beira da estrada,
cheguei na boca da noite,
saí de madrugada”.

Inicialmente, a música tinha apenas essas duas estrofes e o refrão. Ao ser inscrita no 3° Festival Internacional da Canção Popular, Vanzolini acrescentou mais uma estrofe:

“O vento vai pra onde quer
a água corre pro mar
nuvem alta em mão de vento
é o jeito da água voltar.
– Morena, se acaso um dia,
tempestade te apanhar,
não foge da ventania,
da chuva que rodopia,
– Sou eu mesmo a te abraçar”.

Interpretada por Ivete e o conjunto vocal Canto 4, “Boca da noite” classificou-se para a finalíssima da fase nacional, ficando em 8° lugar, numa noite em que o júri deu a vitória a “Sabiá”, de Jobim e Chico Buarque, sob o protesto unânime de um Maracanãzinho lotado exigindo o 1° lugar para “Caminhando”, de Geraldo Vandré.

Toquinho tem mais duas canções com letra de Paulo Vanzolini: “No fim não se perde nada” e “Noite longa”, compostas na mesma época.
Em 1969, Toquinho tornou-se parceiro de Jorge BenJor: “Eu tinha uma namorada, a Carolina. E o Jorge Benjor começou a namorar a prima dela”, conta Toquinho. “Saíamos pela madrugada, íamos com freqüência ao Patachou, um restaurante da rua Augusta, tocava-se violão, era muito agradável. Criou-se então uma amizade maior entre mim e o Jorge. Na casa dessa minha namorada, a Carolina, nós ficávamos comendo pão de queijo e tocando violão. Um dia  ele me mostrou um tema musical, e fizemos uma música, que foi Que maravilha. Ele me mostrou a primeira parte: “Lá fora está chovendo/ Mas assim mesmo eu vou correndo/ Só pra ver o meu amor./ Ela vem toda de branco/ toda molhada e despenteada/ Que maravilha, que coisa linda que é o meu amor”. Desenvolvemos o restante do tema, e eu fiz a letra da segunda parte: “Por entre bancários, automóveis, ruas e avenidas/ Milhões de buzinas tocando sem cessar/ Ela vem chegando de branco, meiga e muito tímida/ Com a chuva molhando seu corpo que eu vou abraçar./ E a gente no meio da rua, do mundo, no meio da chuva/ A girar, que maravilha, a girar, que maravilha”. E logo inscrevemos a música num programa da TV Tupi, um concurso mensal chamado Feira da Música Popular Brasileira. Queríamos que a Gal cantasse, mas ela não podia. Nós mesmos cantamos, o Jorge e eu, e a música pegou o 1o lugar. Gravamos “Que maravilha” e foi realmente a primeira música minha que fez um grande sucesso. Entrou nas paradas, foi muito tocada no rádio, as pessoas cantavam na rua. Do outro lado do disco tinha Carolina, Carol bela, uma canção também feita por nós. Fizemos mais uma música para o Cassius Marcellus Klay, e outra chamada Zana. O Jorge Benjor é uma pessoa muito especial, meu amigo até hoje. Tem uma marcante força intuitiva, rítmica e poética”.

A boa classificação de “Boca da noite” no Festival Internacional e o surgimento vitorioso de “Que maravilha” fizeram com que Toquinho começasse a ganhar destaque como compositor. “Nessa época, primeiro semestre de 69, para marcar o lançamento de ‘Que maravilha’, resolvemos fazer um show dirigido pelo Fernando Faro”, lembra Toquinho. “O show chamou-se ‘Que maravilha’ e foi apresentado no Teatro Cacilda Becker. Além de mim, participavam Paulinho da Viola, Aracy de Almeida, Jorge Benjor, o Trio do Luiz Melo e o Trio Mocotó, formado pelo Nereu, no pandeiro, Fritz, na cuíca e Joãozinho Paraíba, na percussão. Eles tocavam no Jogral e foram arrebanhados pelo Jorge e lançados nesse show. Um time, portanto, pra ninguém botar defeito, capaz de chamar, como se esperava, um grande público. Ao contrário: o show foi um fracasso total, ninguém foi ver. Numa noite chegamos a atuar para 20 pessoas pagantes. Era triste, mas mesmo trabalhando para pouca gente fazíamos daquilo uma curtição”.

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