Toquinho e Vinicius na Itália

Na Itália, Toquinho e Vinicius infiltraram-se pela península em longas e marcantes temporadas. Mas era ainda uma época em que podiam andar pelas ruas de braços dados, protegidos pelo anonimato. Toquinho lembra essa fase: “Curtíamos passear por Firenze, parecendo dois Beatles, cabelos compridos, casacos enormes, bonés e cachecóis. Vinicius adorava admirar as estátuas da Piazza della Signoria. Andávamos por aquelas ruelas, parávamos para falar com as pessoas. Entrávamos nos bares e comíamos presunto cru, pão e bebíamos vinho. E as ideias das músicas brotavam simples e despretensiosas”. Depois, a proteção do anonimato foi de desfazendo. A universalidade da música e da poesia deles expandiu-se dos palcos para os discos. Ao longo dos anos, gravaram o LP infantil “L’arca di Noè”, com Sergio Endrigo; o LP “Per vivere um grande amore”, em italiano; em Milão, quatro horas de estúdio, uma garrafa de uísque do lado, os técnicos no “aquário”, a colaboração especial dos maestros Bacalov e Bardotti, e eles cantando descontraidamente o que lhes vinha à cabeça, originando o LP “Toquinho e Vinicius – O Poeta e o violão”.

Quem ouve esse disco tem a primazia de sentir Toquinho e Vinicius como se estivessem sentados num banco de quintal, conversando entre as músicas e cantando do jeitinho que todo mundo gosta de escutar, sem interrupção, essas delícias como “Marcha da quarta-feira de cinzas”, “Morena flor”, “Chega de saudade”, “Dora”, “Rosa desfolhada”, “Januária”, “Insensatez”, “Tristeza”, “Can-to de Ossanha”, “Berimbau”, “Consolação”, “Apelo”, “Garota de Ipanema”, “O velho e a flor” e “Nature boy”. Pouco tempo depois, caíam nos braços do público italiano com o LP “La voglia, la pazzia, l’íncoscenza, l’allegria”, um documento lírico definitivo, que gravaram com Ornella Vanoni: “…Questo disco é um momento talmente magi-co per me!”, escrevia ela na contracapa. Cantando em todas as faixas, ou sozinha com Toquinho e Vinicius, Ornella é parte integrante da magia desse disco, no mínimo magnífico.

Dico-com-OrnellaO LP não só se tornou um dos mais importantes do ano como, até hoje, jamais saiu de catálogo, sendo ainda um grande sucesso em toda Itália e em muitos outros países. As versões de Bardotti, estudioso da língua portuguesa e falando fluentemente nossa língua, saíram com todo mo-lho e picardia que Toquinho e Vinicius colocaram no momento da composição. O disco é todo emocionante. Parece que, nas expressões italianas, as palavras se desnudam mais, transparecendo a alma do lirismo, principalmente em can-ções como “Samba della rosa”, “Samba in prelúdio”, “Um altro addio”, e nesse raro retrato do cotidiano, cada vez mais moderno, que é “Semáforo rosso”- o “Sinal fechado”, de Paulinho da Viola. Sem dúvida, é esse disco, que carrega o selo RGE e foi gravado no Studio Fonit-Cetra, em Roma, um dos trabalhos mais felizes da dupla Toquinho/Vinicius. Por mais que Toquinho e Vinicius desejassem – e esse desejo era sem-pre duvidoso – livrar-se das cantoras em seus trabalhos, volta e meia elas estavam presentes. Eles não perdiam tempo nem oportunidades.

Nos estúdios de gravação, trabalhavam com Ornella, enquanto para o palco levavam junto a carioquíssima violonista, compositora e cantora Joyce, num espetáculo apre-sentado no Lírico de Milão e no Sistina de Roma, ocasião em que quase duas mil pessoas conseguiram entrar no teatro e mais mil ficaram de fora. Um públi-co, segundo o empresário Franco Fontana, só igualado com Charles Aznavour e Gabriela Ferri.

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2 Respostas

  1. Todo o trabalho da dupla Toquinho & Vinicius é digno de toda a honraria. Eu, pessoalmente, desejo expressar aqui a minha imensa admiração pela magnífica obra dos nossos grandes artistas , em especial ao L.P. ” La voglia, la pazzia, l’incoscienza e l’allegria ” , pelo qual me apaixonei desde o primeiro dia em que o escutei, e que é objeto da minha atual pesquisa musical em homenagem a Toquinho, Vinicius & Ornella Vanoni, em fase de produção. Importante também mencionar o nome do grande Sergio Bardotti , cujas versões das letras para o italiano são incrivelmente maravilhosas. Sou muito feliz em homenageá-los pela grandiosidade e excelência de suas artes, motivo de orgulho para nossa cultura musical brasileira. Minha eterna gratidão a eles , de coração.

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